quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

O Efeito Lázaro

Título original: The Lazarus Effect
De: Frank Herbert e Bill Ramsom 
Ano original / edição: 1983 / 1990
Páginas: aprox. 185 por volume
Editora: Europa-América
Tradução: Francisco Faia
ISBN: 9721031410 (vol.1) e 9721031585 (vol.2)

Este livro é a segunda continuação do Destination: Void. [*]
A história original foi bem estranha, mas era interessante. Tínhamos uma nave com uma tripulação de clones, cada um com uma especialidade, mas apenas uns 5 acordados. O resto congelado para ser serem acordados só conforme a necessidade ou quando a nave atingir seu objetivo. Acontece que a viagem era uma armação. Os responsáveis por ela (que seria mais uma de várias destas falsas viagens) já haviam programado a nave para falhar num certo ponto, de forma que a única escapatória possível para a tripulação fosse criar uma inteligência artificial consciente para resolver o problema - e a criação dessa inteligência é que era a verdadeira intenção.
Isso explica também o nome do livro: como a nave não tinha um destino de verdade, iria parar no meio do caminho, o destino deles era justamente o nada interestelar, daí... "Destino: O Vazio"


Não lembro exatamente que rolo foi esse para precisarem de uma solução tão sofisticada, mas eles terminam. E a nave sai muito mais esperta do que deveria...
E doida.

Tampouco lembro como termina. Mas foi um bom livro.

[* = o nome e as cores entre o meu blog e esse linkado foram uma divertida coincidência, e nós dois ainda adoramos Frank Herbert, muito maneiro. Dei um "Oi" lá para ele até, em outra postagem sobre o FH]

Aí veio a continuação amalucada ("O Incidente Jesus", que não resenharei, porque já li anos atrás), envolvendo engenharia genética, algas inteligentes, uma viagem no tempo para ver Jesus, e "A Nave" por trás disso tudo. Porque depois do primeiro livro ela resolveu que era Deus e povoou um planeta (Pandora) com alguns dos clones congelados. Bizarro. Muito bizarro. Li até o fim, claro, mas acho que o estado de choque ajudou um pouco. Isso faz alguns anos... Estava enrolando para ler as continuações desde então. Não é um livro que dê para ler num momento light qualquer, "ah, hoje acho que vou ler isso aqui para me divertir". Não, para isso vá ler livros de zumbi, se você vai ler a "Tetralogia Void", principalmente as continuações, você tem que estar no clima de ler algo meio confuso, que segue uma história meio doida. Os neurônios terão que se esforçar.

Há um bom parágrafo sobre os livros neste link: É Difícil Ser um Clássico, no site Vimana. O texto é sobre Duna, o parágrafo que eu falo é o primeiro depois da capa do Herdeiras de Duna.

E depois do choque que foi o 1º livro (o 2º na verdade, mas é a primeira continuação), bateu aquela falta de paciência com a continuação seguinte. Depois de 3 páginas confusas você já fica naquele de "onde foi que me enfiei?", mas como o Herbert é um dos meus escritores preferido, resolvi que ia ter que engolir. Claro, como o livro é feito a duas mãos, sempre posso imaginar que as partes ruins não são do Frank. :-)

Em que ponto estamos na história no Lázaro? Mini-recapitulação do primeiro: no primeiro livro a Nave-deus está presente, é um personagem, tem contato com os habitantes do seu planeta e fica fazendo experiências com a humanidade como um todo, dá até a entender que aprontou algo com a História da Terra (pois é, ela consegue). E essa sobra de humanidade está tentando se virar em viver na porcaria de planeta que Nave arranjou, praticamente sem ter onde morar e colonizar (é quase tudo oceano), tendo que criar clones mais adaptáveis, com animais marinhos violentos, e uma alga consciente que na verdade compartilha sua mente com o planeta inteiro, e os clones querendo se rebelar [Planeta Pandora... flora e fauna com mente coletiva... Povo adaptado x Humanos normais.... hummmm... Avatar??]... É, deu merda! Maior matança no final e destruíram a alga. [o que me faz lembrar de outro livro do Herbert, onde matam todos os insetos e depois descobrem que não foi uma boa idéia]

Pois bem, livro seguinte: A desgraça no final do Jesus já faz alguns séculos. A Nave está fora também, a alga-consciente está morta, e os mares subiram e não há mais terra habitável. Estamos num mundo que parece o Waterworld do Kevin Costner. Mas sem os jet-skis. Mentira, no livro até que eles têm bastante coisa, não estão numa espécie de Mad Max marinho não. A humanidade está dividida em duas. Temos as pessoas quase normais, mas que são praticamente sereios (são os "maromens" na tradução portuguesa de Portugal), que vivem no fundo do mar, em cidades meio SeaQuest, com tecnologia mais parecida com a nossa (coisas de metal); e temos os descendentes dos experimentos genéticos criados no 2º livro - temos aí gente com braços gigantes, mulheres de 3 seios, cabeças imensas com olhos laterais, super-visão... todo tipo de anomalia sai desta segunda parcela da humanidade, menos desenvolvida em muitas aspectos, e que vivem em ilhas (eles são os "ilhéus"), com casas criadas organicamente, que precisam ser "alimentadas" (daí ter ressaltado acima que os maromens têm "coisas de metal", a tecnologia deles é "normal", a dos ilhéus é genética - as próprias ilhas estão vivas!).

Os dois lados vivem uma harmonia torta. Há relação política, trocas comerciais, etc, mas os maromens têm um certo desdém dos primitivos e religiosos ilhéus, além de um sentimento meio ariano contra a diversidade física caótica deles; os ilhéus por sua vez invejam as capacidades técnicas dos primeiros, mas não são fãs de sua arrogância e de sua falta de fé. Se bem que os maromens *têm* seus motivos para não terem muita fé na divindade da Nave; mas eles também não querem que todos os ilhéus se explodam (bem, alguns sim), pois eles têm interesse em repopular os mares com a barrilha (alga), mesmo sabendo que esta não será tão consciente como a original, o que permitirá que o planeta volte a ter terra habitável.

No livro, temos vários dos temas preferidos do Herbert: sociedades diferentes da nossa; questões religiosas/messiânicas; e ecologia.

Algo que fiquei com a impressão em algumas partes, não sei se justa, é que os personagens principais não são atores da trama, eles estão praticamente "Forrest Gumpeando" na História. Ok, eles são presos, fogem, matam um aqui outro ali, mas eles pareciam que estavam sendo empurrados de um lado para o outro, sem nenhum poder de interferir ou mudar nada que esteja acontecendo. Mas não é mal, depois que você se acostuma com todos os personagens, e o estilo pesado do Herbert se reentranha, a história flui suave, quase que uma aventura romântica (tem um casalzinho apaixonado entre os "gumps").

O que temos?
Personagens ilhéus: um pescador experiente e seu ajudante, um Juiz (esqueci exatamente o cargo, mas ele é de uma comissão genética, que decide quando fetos mal-formados precisam ser abortados), uma Capelã-Psiquiatra (responsável por tomar conta do híbrido alga-humano que surgiu no final da 1ª continuação), e um historiador que trabalha com alguns maromens.
Personagens maromens: um cientista do bem (que cuida das plantações de algas), a embaixadora maromen entre os ilhéus, uma jovem 'instrutora de algas', e um cientista do mal. [atente: estas são descrições extremamente resumidas e toscas]

O maromen do mal quer acabar com os grotescos ilhéus, assumir o governo da sociedade, ter controle sobre as algas, que por sua vez o permitirá recriar áreas de terra sobre o mar, onde a população poderá voltar a habitar deixando o fundo do mar. Para isso ele precisa da ajuda da embaixadora (não lembro bem porque) e do cientista do bem (para controlar as algas). Os pescadores, o historiador e a instrutora entraram de gaiatos no rolo. O Juiz um pouco também. E a Capelã aparece aqui e ali, principalmente quando temos que ver o que se passa com a híbrida alga-humano, e um agregado que ela tem. Mas não pensem que são personagens inúteis, sem eles não teria história e com eles podemos ter o ponto de vista de boa parte das diferentes sociedades pandoranas. O que eles não afetam muito é a História com H maiúsculo. Ah, e o cientista do mal quer ir em órbita pegar os clones humanos congelados que Nave deixou ainda no espaço. Ninguém sabe bem o que está lá, congelado há séculos, mas ele tem certeza que isso o ajudará em seus planos. ["Cérebro, o que você quer fazer esta noite?"]

Importante, eu não percebi problemas com a tradução portuguesa, há aquelas frases de efeitos frankherbertianas aqui e ali que você fica na dúvida se não fez sentido porque traduziram mal ou se é porque a frase é estranha mesmo, então você fica com a segunda opção (realmente a mais provável) e segue em frente; mas por acaso eu tenho esse livro em inglês também e resolvi ler o capítulo final nele, de bobeira... E não é que eu pego algo que talvez seja um problema sério de tradução? E logo na frase que fecha o livro?
Ou talvez em PT-PT o verbo gostar tenha usos que o PT-BR desconheça... Deixo essa questão para vocês, saquem só:

Contexto:
- personagem X está tentando convencer o Z de que os sonhos dele para o futuro dos povos é o ideal.
- Z não concorda.
- X se espanta e comenta com Y
- E Y, que já tinha sofrido a influência de X antes, não concorda nem discorda, mas responde.

Resposta traduzida: Vês? Gostamos de quem nos força a ter os nossos sonhos.
Resposta original: You see? We care who forces our dreams onto us!

No meu entendimento, Y deu uma bela sacaneada em X, e a frase tem sentido de "Nós nos importamos com quem força sonhos na gente" (porque X já tinha forçado seus sonhos no Y), completamente diferente do que pareceu quase que um agradecimento da versão portuguesa. Preocupante. Faz-me temer pela tradução de outras conversas importantes ao longo do livro. Ou então eu preciso melhorar meu conhecimento verbal do português europeu.
Por falar nisso, quem nunca leu em PT-PT ficam duas dicas: ecrán = monitor; e o pretérito imperfeito deles parece o nosso perfeito: "eu gostava de ir" significa (não sei se sempre) "eu gostaria de ir".

No final, um bom Herbert, não tão estranho como a 1ª continuação, e, como eu disse, depois que se entra no embalo é quase que uma curta aventura - com "planos dentro de planos", tiradas políticas, antropológicas e ecológicas, mas ainda assim, uma aventura. Ao ler O Incidente Jesus eu fiquei reticente de ler as continuações. Ao ler este... eu fiquei curioso como a tetralogia termina. Ao invés de esperar alguns anos, já está na fila para os próximos meses.

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