quarta-feira, 11 de abril de 2012

A Morte da Terra

Pois é, falei na postagem anterior que leria algo mais moderno, mas quiseram as circunstâncias que meu livro seguinte tivesse que ser de bolso e que eu teria poucos por perto para escolha. E o que foi que me pareceu interessante... um livro de 1910!

Título original: La Mort de la Terre
Autor: J.H. Rosny aîné (Joseph Henri Honoré Boex, belga)
[e alguém me explique porque pela internet o "J.H." costuma ser "J.-H."? Para quê o hífen?! Deve ter algum motivo, mas não descobri nem entendi.]
Editora: Livros do Brasil  --  Ano livro / história: 1959 / 1910
Páginas: umas 110 de história mais minibiografia.
Acabamento: normal para um livro de bolso, mas os da Coleção Argonauta costumam ser mais resistentes que o comum, e este não faz feio. O livrinho tem mais de 50 anos e as páginas estão firmes e fortes! Meus netos o lerão ainda. Em compensação tem muito livrinho de bolso dos anos 70/80 por aí já pedindo arrego...

Mas vamos lá... De cara, apesar da mesma época, o livro não tem nada a ver com o estilo da série marciana do Burroughs. Nada de machão irresistível salvando o mundo. [eu falo assim, mas eu gosto dos livros do John Carter...], na verdade, me lembrou um pouco o de outro francês, o Quinzinzinzili de Régis Messac [com um sobrenome desses, esse cara teria sofrido no meu colégio...], que envolve a morte da maior parte da raça humana e uns poucos sobreviventes. OBS: este também existe em português, com o nome de A Invenção do Mundo.
Nunca ouvira falar do escritor até pegar o livro para ler (assumo, eu comprei pelo título e pelo preço) mas, ao que parece, o cara é um gênio esquecido. Este link diz que ele é o principal escritor de FC em francês após o bom e velho Júlio Verne. Não sei, mas fiquei curioso de ler mais coisa dele.

O que temos é uma história pós-apocalíptica onde, após muitas dezenas de milênios, a água é o bem mais precioso que a humanidade tem. E não é naquele sentido Tank Girl, o filme, realmente... não tem mais. Após milênios de terremotos, engolindo cidades e criando fissuras na terra para onde a água foi e não voltou mais, sobraram escassas comunidades, com poucos milhares de habitantes, que vivem em volta dos poucos poços conhecidos e com leis rígidas para conservação da água.
Num dado momento do livro, por ex., uma das comunidades perde um dos seus reservatórios e é declarada, no mesmo instante, com anuência de todos na mais absoluta tranquilidade, a eutanásia de 90% da população. Numa situação ligeiramente menos dramática no início do livro, uma cidade perde seu poço após um terremoto e se prepara para mandar refugiados para as cidades vizinhas. Não só esta população imigrante passa a estar proibida de se reproduzir, como a cidade receptora define 15 anos de racionamento e o veto a reprodução interna - para que a população possa pouco a pouco baixar até números mais administráveis dada a quantidade de água disponível.

O escritor não explica bem esse sumiço da água. Não sei se por falta de conhecimento geológico dele, se existe a mais vaga possibilidade [falta de conhecimento geológico meu, apesar de não achar possível] ou se foi só uma liberdade criativa, para poder ter a história. Só falo logo que é para vocês não se preocuparem com isso. É detalhe.

O que importa é que temos pouca água. E temos passarinhos inteligentes. Sim!! Parece que a medida que todos os seres do planeta morreram, os pássaros ficaram mais espertos. Vai entender...
Mas não se preocupem, eles mal aparecem e não falam nem nada.
E além terremotos, pacíficos e sedentos figurantes de Mad Max, planadores à lá John Carter, e passarinhos espertos, o escritor completa a população do futuro com os Ferromagnéticos. O que são eles: não consegui montar uma boa imagem mental não... Quando criança vocês já pegaram um imã e passaram por um local cheio de pó metálico e depois ficaram brincando com aquilo, criando formas? [não?! que absurdo... eu já.] Pois foi assim que os imaginei, montinhos de poeira metálica disformes. Alguns mais altinhos, outros planos, e alguns mais avançados pareciam aqueles cupinzeiros africanos (mas não tão altos, metro e meio no máximo); mas não tenho idéia se os imaginei corretamente. Mas não expliquei o que são eles: são uma forma de vida mineral que vem pouco a pouco surgindo sobre o planeta. Eles se alimentam de ferro e são perigosos para as pessoas por destruírem sua hemoglobina, mas movem-se tão vagarosamente (metros por dia) que na maioria dos casos são facilmente enxotados (ou destruídos, não ficou claro). Mas que você não me durma à céu aberto, fora das cercas protetoras das vilas!
Ai, ai, ai, hein!

Num dado momento da história o escritor tenta explicar a organização (?) social (?) desses seres. Não entendi. E não fez falta entender. Numa outra parte mais interessante ele explica um pouco da desgraça que aconteceu na Terra nos últimos 100 mil anos.

Voltando a história principal... A trama gira em torno de um sujeito de uma das vilas, enviado para avaliar a situação de uma outra, que sofreu o terremoto do começo do livro que falei acima. É um sujeito um pouco irrequieto, que lamenta a falta de espírito de aventura da humanidade alquebrada de então. E isso o leva a uma descoberta que pode ajudar a vila em necessidade. Mas não se engane, é um livro triste. Lembrem-se: já falei que somos poucos, em volta da pouca água, que some fácil, e se te mandarem para lista da eutanásia, você vai sem reclamar. Você tem que estar num mundo MUITO deprê para tudo isso ser considerado normal. Só não confunda isso com ser dramático, você não chorará com nenhuma cena horrível. É apenas triste.
Mas é um livro legal. Você fica com vontade de saber o que acontece em seguida. São capítulos curtos com nomes sugestivos, e ninguém fica filosofando sobre a natureza humana a beira do fim nem nada.
Se bem que o personagem principal tem o hábito de falar sozinho...

Ah, só um aviso que me causou confusão no começo, o que o cara chama de "planetário" tem esse nome por ser um sistema de comunicação de grande alcance. Não tem relação com aquele lugar onde você senta e assiste projeção do céu...

Acho que é isso. Terminei de ler a pouco, mas se escrever mais eu resumo o livro todo. Que já é bem curto. Devo tê-lo lido em pouco mais de 2 horas ao todo.

E vi que estou bem acompanhado... Achei outra resenha em português, por ninguém menos que o Miguel Carqueija (brinde: e-book gratuito de "A Face Oculta da Galáxia" no fim da página no link anterior). E tem uma entrevista interessante dele aqui.
E o link da resenha: E por falar em fim do mundo...

E uma resenha em inglês, do Washigton Post. Coincidentemente, de menos de 1 semana atrás. E não é bem deste livro, é de um que reúne 3 histórias do Rosny, mas A Morte da Terra é uma delas. Three Science Fiction Novellas: From Prehistory to the End of Mankind [e o misterioso hífen está lá...]
E permitam-me roubar logo uma frase dele, pro caso de vocês ficarem com preguiça:
« I was unprepared for the power and beauty of “The Xipehuz,” “Another World” and “The Death of the Earth.” There’s nothing hokey or dated about these startling visions of Otherness, although they were first published more than a century ago. You won’t read better science-fiction stories — or even better stories — this year. »  Michael Dirda, crítico literário ganhador do Pulitzer.

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